MEMÓRIAS - Balneários de Manaus
Todos os sábados nossa família saía para se divertir em algum dos “banhos” ou balneários perto da cidade. Não íamos nunca aos domingos, porque era dia sagrado, Dia do Senhor, separado para a igreja, quando participávamos dos cultos e da Escola Dominical na Primeira Igreja Batista.
Papai e mamãe saíam bem cedinho com as cestas de vime para ir ao Mercado Municipal para comprar os mantimentos para as nossas aventuras. Sempre íamos no taxi do seu Aerolino e nos dirigíamos para algum desse balneários na periferia da cidade.
Às vezes íamos ao Satélite. Era o banho da AABB (Associação Atlética do Banco do Brasil). Havia uma estradinha que descia ladeada com muitas árvores, e que dava acesso à área onde havia uma casa de madeira do zelador e uma piscina rústica de madeira, com um igarapé de águas cobreadas, geladas e correntes. Ali passávamos o sábado inteiro pulando n’água e mergulhando naquela piscina de águas limpas e geladas. Hoje o Satélite foi engolido pela urbanização anômala, e no lugar, há um gigantesco depósito das lojas Ramsons.
Outros fins-de-semana íamos ao Parque 10 de novembro, onde havia uma piscina enorme de concreto (veja a foto acima), com águas correntes escuras e frias. Lembro bem daqueles dias ensolarados, meu corpo ainda molhado do mergulho no igarapé, sentamos nos banquinhos em torno de um dos inúmeros chapéus de palha espalhados pelo bosque, os pés descalços bulindo a areia úmida, minha mãe, dona Nadehyde, destampando as vasilhas, servindo o almoço, cheiro gostoso de galinha assada, acompanhada de farofa e maionese, meu pai retirando das cestas de vime os talheres, os copos, e os guaranás. Eu ali, sentindo a brisa do início da tarde sibilando entre as copas das árvores, ouvindo os sons estridentes dos papagaios, araras e e periquitos numa verdadeira algazarra, e os rugidos indefinidos dos animais vindos das gaiolas do zoológico que ali havia, o mundo inteiro como que congelando naquela cena bucólica, em uma Manaus que já não existe mais... hoje o igarapé do Parque 10 é um esgoto pútrido à céu a aberto. E a estrutura de concreto da antiga piscina se deteriorou entre o mato que ali prolifera.
Ponta Negra. Era outro passeio inesquecível. Mesmo porque era muito longe do centro da cidade e era preciso se programar pra ir para lá. Era uma praia natural de areias brancas, cheias de árvores frondosas, e na ponta que entrava para o igarapé do Tarumã, haviam espalhados por toda a extensão da praia, enormes blocos naturais de pedras, e muitas árvores onde subíamos e pulávamos lá embaixo na água, o que faziam a alegria das famílias que ali concorriam. Hoje, aonde era uma praia natural que todos podiam freqüentar, tem Hoteis de luxo que depositam seus “ricos” detritos nas águas do Rio Negro. A área que era de domínio público, agora é restrita e é preciso dispor de muitos reais e dólares pra se ter acesso.
Meu pai sempre gostou de nadar em lugares com muitas águas. Ele entrava na água e ficava horas nadando em sua cadência lenta, mas firme. Ele esticava o braço direito num longo impulso, e assim, controlando a respiração, nadava longos percursos. É o caso da Praia Dourada. Outra praia virgem de areias alvas, situada em uma enseada magnífica do Tarumã, com um bosque que em tempos de cheia, era invadido pelas águas formando um igapó misterioso, aonde nossas canoas singravam suas águas negras e tranqüilas. Na estrutura ali feita, haviam trampolins flutuantes espalhados por toda a extensão da enseada, onde podíamos pular nas águas negras e geladas até dizer chega. Também podíamos remar os caiaques disponíveis e atravessando o rio, chegar a uma praia paradisíaca com areias brancas e muitas árvores frutíferas, onde ficávamos de “bubuia” na água fria da praia até que decidíamos voltar para praia Dourada, onde já nos aguardava uma banda generosa de tambaqui assado na brasa, com farinha e pimenta malagueta. Tempos bons aqueles!
Haviam outros lugares que lembro, como o Paredão, onde havia a Colônia Agrícola, e acolhia em sua vila retiros memoráveis da Primeira Igreja Batista. Lembro da enorme escadaria de mais de duzentos degraus que dava acesso à praia do Rio Negro.
Outros recantos inesquecíveis como o Zivan, sítio do meu tio Armando, com seu igarapé de águas correntes onde brincávamos incansavelmente, alocado em uma região que hoje considero as imediações da Frigêlo, perto do conjunto Duque de Caxias; o Meu Cantinho, a Palmeirândia, o Caiçara (aonde se ergue hoje o “magnífico” shopping Plaza), lugares fantásticos que se diluem juntamente com as lembranças esparsas, que se não publicarmos para eternalizar para a posteridade, tendem a se perdar nas teias implacáveis do tempo que passa veloz.
E o que dizer da Ponte da Bolívia, da cachoeira do Tarumã, e muitos outros lugares perto da cidade, onde as famílias se deleitavam, e fugiam para um refúgio ecológico onde se respirava ar puro e se usufruia de uma natureza exuberante?
Naquele tempo não precisava se ir muito longe para se ter o céu na terra...
Comentários
Fico absolutamente triste de saber que nossos exuberantes balneários foram devastados por essa ganância humanda, maldita especulação imobiliária de quem quer ganhar dinheiro "do nada".
Imagina se hoje, com toda essa questão ambiental, Manaus tivesse encravada em sua área urbana todos esses balneários preservados e em plena utilização?
Lamentável.
PS: Manoel, vc teria fotos desses outros lugares para mostrar?
Jó Farah
FERNANDO ALMEIDA