RECIFE- Viagem de Reconhecimento
Entre 1976 e 1983 Recife foi minha casa. Meus pais foram morar lá porque a universidade de Manaus estava exigindo aos professores que tivessem pós-graduação e meu pai então decidiu fazer esse curso na Faculdade de Direito do Recife. Eu era único filho solteiro, e minha ida com eles foi natural, simplesmente tive que acompanhá-los, de livre e compulsória vontade.
No início, papai e eu fomos à frente para vermos moradia e um colégio pra mim. Ficamos hospedados em um hotel perto do rio Capiberibe, bem pertinho da Praça Joaquim Nabuco no centro de Recife. De cima do apartamento vi a beleza do centro antigo da cidade, as margens negras do rio cortadas de pontes, as gaivotas em seu vôo rasante, os casarios de fachadas antigas, os edifícios de simetria repetida ao longo das ruas centenárias. O cheiro da maresia, o vento constante, o movimento nas ruas e praças (sem a violência e a criminalidade dos dias atuais), com sua diversidade de sons e cores, vendedores, carregadores, gente apressada, as praças com os velhinhos aposentados jogando dama, os camelôs na Rua Imperatriz e na ponte. Fiquei encantado com a cidade assim que andei por ela.
Andando, via os nomes das ruas: Rua da Palma, Rua Sete de Setembro, Conde da Boa Vista, Rua da Aurora, Ponte da Boa Vista, Rua Nova. Novidade. Tudo era espanto, admiração e uma baita sensação de liberdade explodindo no peito... deixando o coração de um adolescente amazonense alumbrado diante de toda uma cidade a ser desbravada.
Papai conseguiu alugar um apartamento em um prédio na Rua Visconde de Suassuna, bairro de Boa Vista, toda ornada de alamedas do inicio ao fim. Ainda lembro o túnel de árvores antigas dando um charme especial de cidade bem urbanizada, ao estilo europeu.
O prédio que iríamos morar era muito antigo, mas com a vantagem de ficar perto da Praça Treze de Maio, uma praça enorme com um lago onde os patos e cisnes nadavam, com muitas árvores frondosas ao redor e bancos espalhados sob a sombra refrescante das copas esparramadas, e onde se situava a Faculdade de Direito que papai iria estudar. Minha mãe quando viu mais tarde o aspecto do prédio, logo o apelidou de "Baependy", fazendo alusão ao cargueiro brasileiro que em 1942 foi atingido por dois torpedos de um submarino alemão, ou seja, o aspecto por fora era meio decadente, com depósitos e lojinhas de concertos de relógio ao longo do corredor que dava acesso ao hall de entrada dos apartamentos do edifício, mas o nosso era claro e confortável, e satisfazia nossas exigências. O vento açoitava constantemente as janelas, ao ponto de sermos obrigados a deixar somente uma pequena fresta aberta senão voava tudo dentro de casa. Na entrada do prédio havia uma lanchonete que preparavam uma pizza de mussarela deliciosa, apesar da aparência rústica e sombria do local.
Enquanto estávamos em Recife em nossa missão de reconhecimento, à noite, aí pelas 18 horas, descia do hotel e tomava o ônibus bem ali pertinho na praça Joaquim Nabuco para ir ao bairro de Boa viagem onde iria encontrar os amigos de Manaus da família Balbi, Hilda, Agnelo e Camilo, que já estavam morando em Recife, pois a mãe, dona Lyris, estava também fazendo um curso de especialização na área de geografia na Universidade Federal do Recife.
Papai conseguiu vaga para mim no Colégio Americano Batista, uns vinte minutos a pé de onde morávamos. Quando mais tarde nos mudamos definitivamente, amava ir a pé para o colégio, passando por ruas antigas bem arborizadas. Ali cursei o terceiro científico, e tenho boas lembranças de sua estrutura antiga, com salas de aula com pisos em degraus de madeira escura, as janelas frisadas nas paredes grossas, suas áreas internas repletas de jardins e gramados onde podíamos descansar depois de almoçar no Bom Preço, um supermercado que ficava ao lado do colégio.
Nesse período que estavámos somente eu e papai, à noitinha, adorava fazer o percurso até Boa Viagem, passando por ruas desconhecidas, mercados apinhados de gente, fortes do século XVI, igrejas do tempo colonial, para depois encher os olhos ao descortinar a orla marítima, sentindo o vento fresco soprando no rosto, e eu me aventurando em uma cidade mágica que seria minha casa por sete anos.
Voltamos à Manaus, já sabendo onde íamos morar e onde eu haveria de estudar naquele ano. Marcado no calendário, final de 1976, véspera de 1977.
Continua...
Comentários
A praça 13 de Maio foi revitalizada à alguns anos atras e tava muito bonita na última vez q fui lá.
As vezes qd num tinha nada pra fazer, pegava um ônibus "Engenho do Meio", e ia pro centro passear, sozinho, gostava de ver akelas ruas movimentadas, os casarões, as praças, as pontes, as paisagens, andava a tarde inteira pelo centro da Veneza brasileira.
Eu sou apaixonado pelo centro de Recife, na verdade acho muito charmoso o centro de grandes cidades, gosto d passear no centro d Manaus e amei o de BH.
Isso foi nostálgico pra mim Manel, Hehehehe.
Valeu!
eu conheci recife era adolescente ainda tb, lembro de ter gostado bastante da cidade, principalmente das praias e do vento. Preciso voltar lá qualquer dia desses =]
belo relato.
Embora tenha nascido em 1978 e nunca ter ido á Recife, realmente, da forma que descreveu o local que habitou por 7 anos, faço coro ao Marcelo, acima, que tambem fiquei curioso em conhecer Recife. Claro que tendo como base a excelente descrição de seu texto, creio que ficarei em parte decepcionado, pois hoje, alguns anos depois, muitas coisas mudaram, a julgar pela violência, tanto é que observou, mas creio que a beleza do local manteria a boa expectativa.
No mais, lhe desejo um excelente Natal e Paz.
Agora estou me dedicando ao blogs que sigo e como o seu é um deles, provavelmente me verá mais vezes por aqui.
Paz e abraço.