envelhecer é preciso


                    UMA ANÁLISE EXISTENCIALISTA CRISTÃ DA VIDA E DA MORTE
        Todos envelhecem. Isso é um fato indiscutível e uma ação do tempo inexorável. Com algumas exceções dependendo da idade, para alguns aos 40, para outros privilegiados depois dos 50, mas os traços da velhice começam a se desenhar no corpo e rugas, pés de galinha, culotes, estrias, celulite, varizes e dezenas de marcas de expressão eclodem nos cantos dos olhos, ao redor da boca, no pescoço, e quando num belo dia você se olha no espelho, lá estão elas. A pele vai ficando ressequida, a barriga infla, o cabelo cai ou fica branco, o pescoço ganha uma papada mal vinda, a estrutura óssea encolhe, e as articulações das juntas começam a ranger. 
        Como dizia o poeta e compositor Taiguara dos anos 70, versando sobre o velho: 
Vão nascendo as rugas 
Morrendo as fugas a as ilusões
 Tateando as pregas 
Se deixa entregue às recordações
...Range o velho barco 
 Lamento amargo do que não fez 
E o futuro espelha
 Esse mesmo velho que são vocês. 
        O que mais me impressiona é a luta desesperada de homens mortais se debatendo contra a força do tempo, mas Jesus diz que os homens não podem acrescentar um centímetro a sua estatura ou um dia a sua vida, na tentativa de refrear a correnteza implacável do envelhecimento. Fico observando de longe algumas celebridades do cinema, da televisão ou da vida pública em geral o que fazem a si mesmos para tentar vencer essa batalha. Gente que tem grana, fortuna, poder, influência, e aja aplicação de botox, lipoaspiração, lipoescultura, dietas rigorosas, horas infindas em academias, tentativas frustradas para esticar a pele e a vida, mas a textura da pele já sem elasticidade insiste teimosamente em engelhar como a casca de uma fruta madura. 
        Acho muito deprimente quando vejo em uma revista, ou em programas matinais alguém que repuxa tanto a pele do rosto chegando bem perto de parecer uma aberração, uma caricatura, um coringa de lábios repuxados e borrados, lá estão os músculos paralisados, as bordas carnosas entumecidas artificialmente moldados, com boca de peixe como um amigo se referiu a esses que põem botox nos lábios. 
        Sim, sim, eu sei, você vai me falar que a estimativa de vida subiu bastante, que se chega facinho aos 90, que existem muitas maneiras no mundo de hoje que podem driblar a velhice, formas variadas de maquiar a carcaça, cosméticos fantásticos, corretivos, reparadores anti-idade, e tem os alimentos nutritivos, os exercícios físicos, o cultivo do bom humor, da boa leitura, ginkobiloba, guaraná em pó e açaí. Certo, mas tudo isso não vai conseguir enganá-la por muito tempo. 
        Todos envelhecemos, e Gabriel Garcia Marques no seu livro Memórias de minhas putas tristes diz que a verdade é que os primeiros sintomas de velhice é quando começamos a parecer com o próprio pai, e as primeiras mudanças são tão lentas que mal se notam, a gente continua se vendo por dentro como sempre foi, mas de fora os outros reparam. 
        Não quero ser drástico demasiadamente, mas se vocês que são jovens hoje, cheios de força, charme e sonhos, se forem bons sobreviventes na vida e driblarem as doenças comuns ao nosso tempo, câncer, diabetes, pressão alta, e tantas outras, e se não forem colhidos prematuramente por algum acidente mortal (que Deus os livre e guarde), farão inevitavelmente essa caminhada inflexível rumo á velhice e à morte. Interessante o que As Escrituras têm a nos dizer sobre a velhice e a brevidade da vida, e nessa matéria ela é bem realista, sem floreios. 
        Eu já visitei muitos velhinhos quando ia dar a santa ceia, e via quantos semblantes retorcidos, e ouvia os murmúrios dos que estão cansados de viver, contemplava aqueles arremedos do que foram um dia, cheios de beleza e vigor, agora marcados pelo enfado, pelos achaques e pela dor, companheiros cruéis do cotidiano e da rotina infinda. 
        A bíblia poetiza, mas não faz rodeios: 
        A vida é breve e é como a sombra que passa, é como o capim do campo que de manhã floresce, mas à tarde murcha e seca, é como um correio veloz e é como o vapor da madrugada que logo desvanece, vida é sopro, é correr atrás do vento, é vaidade, bolha de sabão. Vida é envelhecer até os 70 anos, ou havendo vigor, até os 80, mas o que passar disso é canseira e enfado. Velhice é viver a agonia dos maus dias dos anos dos quais diremos: não temos neles prazer, porque velhice é o apagar da luz do sol, da lua e das estrelas do esplendor da vida, é como o embaçamento dos olhos, nuvens depois do aguaceiro do choro incontido sem motivo, tempo de braços e pernas que arqueiam e bambeiam, de perder os moedores da boca, de escurecimento dos olhos na janela, da perda da voz, de lábios que se selam porque o coração ensimesmou-se, da diminuição generalizada das percepções, da perda gradativas dos sentidos, dos sons rarefeitos que não discernem mais os cantos longínquos das aves como um sussurro distante, do torpor que enfastia e destrói o desejo de ouvir música, e quando as harmonias e as filhas da música entoam suas canções e se ouve somente o eco de um leve sucio desvanecido. Velhice é temer os lugares altos, ter surtos e sustos no caminho de longos períodos de insônia, de sentir o peso de um gafanhoto como um chumbo, é perda de cabelos, ou quando estes se tornam em linguagem regionalizada, brancos como farinha de tapioca, de perda de apetite diante de uma suculenta costela de tambaqui com farinha, limão e pimenta (estamos muito distanciados do contexto da Palestina e da flor da amendoeira e dos grãos tostados que menciona o livro de Eclesiastes). É o apagar das luzes, o rompimento do fio de prata, do copo de ouro que despedaça e do cântaro que se quebra junto ao poço. Jesus falou para Pedro que um dia os outros o vestiriam e ele seria conduzido para onde ele não queria ir. Por isso a necessidade de dizermos como Pedro: Senhor, tu sabes que te amo. E essa vida de amor e amizade com o Mestre vai permear toda a existência e será lastro para termos completa segurança no dia em que voltamos para a casa eterna, a casa do Pai, o pó voltando à terra e o espírito voltando a Deus. 
        O pastor José Mattos, pastor, intelectual, advogado e excelente cristão, no final da vida, antes de empreender sua derradeira viagem rumo à eternidade, cansado, quase cego, com alzheimer, milagre de lucidez e clareza de mente nas últimas horas de vida, disse à esposa, às filhas e aos netos: Já está na hora: Estou indo para casa. 
        Você acha que esses dias estão muito longe? Olha, porque a vida é curta, devemos aprender a orar como Moisés: Ensina-nos a contar os nossos dias para que alcancemos um coração sábio. 
         Se vivermos nossos anos cultivando uma juventude com alegria, lembrando-se constantemente do Criador, e experimentarmos uma maturidade com temor e conhecimento progressivo de Deus, quando chegar então a velhice, mesmo com as dificuldades que isso acarreta, produziremos muitos frutos e seremos como carvalhos de justiça plantados na casa do Senhor para sua glória.

Comentários

markeetoo disse…
Belo texto!
Acho legal encarar esses indícios da velhice tambem como um marco. Sinal de que esse corpo perecível, corruptível está chegando ao fim e logo logo receberemos aquele corpo glorificado, tão difícil de entender com nossa compreensão limitada.
Anônimo disse…
Muito bom. Gostei de ler, uma vez que comecei a notar o meu proprio pai tambem no espelho, haha. Que belo.
Marilena Silva disse…
Muito legal!!! as vezes é um pouco triste perceber que na nossa cabeça a gente consegue fazer certas coisas que antes fazíamos e perceber que o corpo não acompanha com a mesma agilidade, dá uma tristezinha, mas é muito bom poder reconhecer o cuidado de Deus.

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